22 jul 2017

A arbitragem como meio de solução para os conflitos individuais do trabalho

postado em: Coluna da Zafalão

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Prevista inicialmente em nossa atual Constituição Federal no artigo 114 e posteriormente regulamentada pela Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, a Arbitragem é tida como uma forma alternativa de solução de um conflito, feita por um terceiro alheio ao conflito, denominado árbitro, que serve como intermediador para obter o consenso entre as partes, ou então, sugerir uma solução final ao conflito.

Considerável parte da Doutrina e da jurisprudência consideram inadmissível a utilização da arbitragem para solução de conflitos individuais no Direito do Trabalho, alegando como motivos, principalmente: e irrenunciabilidade do crédito trabalhista; a hipossuficiência do trabalhador; o direito ao acesso amplo e irrestrito do trabalhador ao Judiciário Trabalhista (art. 5º, XXXV da CF/88); bem como o fato de que a subordinação decorrente do contrato de trabalho pode impedir a livre manifestação da vontade do trabalhador.

Entretanto, em diversas situações, é imprescindível reconhecer a utilidade da via arbitral para solucionar conflitos trabalhistas individuais, visando principalmente o alcance da solução de conflitos de forma mais célere e eficaz, ainda mais se considerarmos que a arbitragem é opção; liberalidade das partes, ou seja, é possível que prefiram se socorrer ao Poder Judiciário em eventual conflito, e por esta razão não há que se falar em restrição ao acesso amplo e irrestrito do trabalhador à Justiça.

Quanto à irrenunciabilidade absoluta do crédito trabalhista, é possível afirmar que a transação será aplicável somente se não acarretar renúncia de direitos do empregado e, caso implique, somente será válida se não forem ofendidos os dispositivos cogentes do direito do trabalho, em especial o art. 9.º, art. 444 e art. 468 da CLT.

Vale lembrar que até mesmo em eventual litígio judicial as partes podem transacionar- observando sempre o que prevê a legislação aplicável-, e tal transação se torna ainda mais facilitada se considerarmos que os acordos, via de regra, só ocorrem quando o contrato de trabalho é rescindido ou está em vias de rescisão.

Em relação à hipossuficiência do trabalhador, é possível que seja mitigada por alguns fatores: 1) pela condição intelectual daquele (indivíduos formados, empresários, por exemplo); 2) por estar acompanhado e assistido por advogado(s), ou seja, por profissional(is) capacitado(s), confiáveis e aptos a proteger seu interesse; 3) e/ou até mesmo por estar assistido pelo corpo jurídico do Sindicato de sua Classe, por exemplo.

Ora, é cediço que a Justiça do Trabalho também está sobrecarregada, haja vista não somente só a elevada quantidade de ações, mas também por pedidos demasiados e que por vezes extrapolam o devido, fato este que resulta em demora excessiva no desenvolvimento do processo, em claro atentado aos insignes princípios constitucionais da economia e celeridade processuais.

Outrossim, é possível dizer que a composição entre as partes pode até mesmo viabilizar soluções a conflitos que sequer seriam levados ao conhecimento do Judiciário, eis que pode ser tida como uma alternativa mais viável e segura para ambas as partes envolvidas.

Assim sendo, como visto, em alguns casos, não reconhecer a validade da resolução de conflitos trabalhistas individuais levada a cabo fora do âmbito da Justiça do Trabalho é fechar olhos à possibilidade de existência de uma solução devidamente especializada, mais rápida, segura e eficaz. Além disso, eventuais nulidades provenientes da escolha pela arbitragem, poderão ser questionadas e apreciadas pelo Poder Judiciário.

Por tais razões, inclusive, parte da jurisprudência já se pronunciou pela aceitação de solução alternativa a conflito trabalhista individual:

ADMINISTRATIVO. FGTS. LIBERAÇÃO. ART. 20, I, DA LEI Nº 8.036/90. DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA. SENTENÇA ARBITRAL. – O art. 20, I, da Lei nº 8.036/90, permite o levantamento do saldo da conta fundiária de trabalhador demitido sem justa causa. – “É válida a arbitragem como forma de solução de dissídio individual trabalhista, sendo a sentença arbitral documento hábil para comprovar a rescisão contratual sem justa causa, viabilizando-se, por isso, o levantamento do saldo da conta do FGTS, nos termos do que autoriza a Lei 8.036/90”.(extraída da sentença de primeiro grau proferida nos presentes autos pelo Juiz Federal Marcus Vinicius Parente Rebouças) – Remessa Obrigatória improvida. (TRF-5ª, EOMS 97810 CE 2005.81.00.015583-9, Primeira Turma, Diário da Justiça – Data: 28/06/2007 – Página: 696 – Nº: 123 – Ano: 2007, Julgamento 31 de Maio de 2007, Relatora Desembargadora Federal Jose Maria Lucena)

“DISSÍDIO INDIVIDUAL – SENTENÇA ARBITRAL – VALIDADE – EFEITOS – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – ART. 267, VII, DO CPC – I- O art. 1º da Lei nº 9.307/96 , ao estabelecer ser a arbitragem meio adequado para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, não se constitui em óbice absoluto à sua aplicação nos dissídios individuais decorrentes da relação de emprego. II- Isso porque o princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas deve ser examinado a partir de momentos temporais distintos, relacionados, respectivamente, com o ato da admissão do empregado, com a vigência da pactuação e a sua posterior dissolução. III- Nesse sentido, sobressai o relevo institucional do ato de contratação do empregado e da vigência do contrato de trabalho, em função do qual impõe-se realçar a indisponibilidade dos direitos trabalhistas, visto que, numa e noutra situação, é nítida a posição de inferioridade econômica do empregado, circunstância que dilucida a evidência de seu eventual consentimento achar-se intrinsecamente maculado por essa difusa e incontornável superioridade de quem está em vias de o contratar ou já o tenha contratado. IV- Isso porque o contrato de emprego identifica-se com os contratos de adesão, atraindo a nulidade das chamadas cláusulas leoninas, a teor do 424 do Código Civil de 2002 , com as quais guarda íntima correlação eventual cláusula compromissória de eleição da via arbitral, para solução de possíveis conflitos trabalhistas, no ato da admissão do trabalhador ou na constância do pacto, a qual por isso mesmo se afigura jurídica e legalmente inválida. V- Diferentemente dessas situações contemporâneas à contratação do empregado e à vigência da pactuação, cabe destacar que, após a dissolução do contrato de trabalho, acha-se minimizada a sua vulnerabilidade oriunda da sua hipossuficiência econômico-financeira, na medida em que se esgarçam significativamente os laços de dependência e subordinação do trabalhador face àquele que o pretenda admitir ou que já o tenha admitido, cujos direitos trabalhistas, por conta da sua patrimonialidade, passam a ostentar relativa disponibilidade. Desse modo, não se depara, previamente, com nenhum óbice intransponível para que ex-empregado e ex-empregador possam eleger a via arbitral arbitral para solucionar conflitos trabalhistas, provenientes do extinto contrato de trabalho, desde que essa opção seja manifestada em clima de ampla liberdade, reservado o acesso ao Judiciário para dirimir possível controvérsia sobre a higidez da manifestação volitiva do ex-trabalhador, na esteira do artigo 5º, inciso XXXV da Constituição. VII- Tendo em conta que no acórdão impugnado não há nenhum registro sobre eventual vício de consentimento do recorrido, ao eleger, após a extinção do contrato de trabalho, a arbitragem como meio de composição de conflito trabalhista, uma vez que a tese ali sufragada ficara circunscrita à inadmissibilidade da solução arbitral em sede de dissídio individual, não se sustenta a conclusão ali exarada sobre a nulidade do acordo firmado pelas partes perante o Tribunal Arbitral. Recurso conhecido e provido.” (TST – RR 144300-80.2005.5.02.0040 – Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen – DJe 04.02.2011 – p. 1640).

“COMPROMISSO ARBITRAL – A indisponibilidade dos direitos trabalhistas e a hipossuficiência do trabalhador são os motivos que têm impedido o reconhecimento da validade da cláusula arbitral no contrato de trabalho. Não é essa, porém, a situação materializada neste feito. O reclamante tem notável formação acadêmica e exercia a função de alto executivo da reclamada, para a qual auferia expressivos vencimentos, como ficou incontroverso. Não pode ser entendido, diante deste quadro, que foi implicitamente coagido a aceitar os termos do contrato de gratificação (documento 53 do primeiro volume em apenso), pois detinha todas as condições para negociar livremente sua contratação. Esse contrato previa o pagamento de bonificação ao reclamante para a hipótese de não se desligar voluntariamente do emprego, exigindo, ainda, a abstenção da prática de atos de concorrência comercial. O bônus em questão é, por evidência, prêmio que se destina a incentivar a permanência de profissionais altamente qualificados no emprego, fugindo do padrão dos títulos de natureza trabalhista. Aplica-se ao caso concreto, assim, o artigo 104 do Código Civil, pois o reclamante aceitou livremente os termos do “plano de retenção” que lhe foram oferecidos. Os agentes deste ato jurídico são capazes, o objeto é lícito e a forma não é defesa em lei, o que valida os termos da contratação. Se o ajuste é válido, o mesmo efeito deve ser reconhecido à cláusula que estipulou a obrigatoriedade de se submeter a solução de eventual litígio à câmara de arbitragem do Rio de Janeiro. A eleição da arbitragem como meio de solução de eventual conflito, feita pelas partes no ato da contratação, é válida. Ficam, portanto, extintos sem resolução do mérito os pedidos de letras “a” e “b” da peça inicial, nos termos do artigo 267, incisos IV e VII, do CPC, diante da presença de pressuposto processual negativo a impedir a válida instauração do processo. (TRT-2ª R. – SENTENÇA DE MÉRITO – 00021863420105020076 – Juiz Helcio Luiz Adorno Júnior – DOE/SP 01.02.2012).

Conclusivamente- tendo em mente a necessidade de modernização e adaptação do direito do trabalho aos dias atuais, mas sempre levando em conta que primeiramente sua razão de existência e finalidade é desempenhar o papel de sistema jurídico de proteção ao trabalhador-, se verifica que a arbitragem é um instrumento valioso e legítimo no que tange à colaboração com o Poder Judiciário.

No âmbito dos conflitos individuais trabalhistas, a arbitragem traz a possibilidade de resolução do conflito com maior sigilo, objetividade e rapidez, o que se opõe à complexidade, publicidade e morosidade do processo judicial.

Assim sendo, é indispensável que o procedimento em análise seja efetivado com extrema acuracidade e se mantenha isento de vícios, desse modo, a arbitragem na área individual trabalhista poderá ser considerada segura e não passível de anulação pelo Poder Judiciário, observado o disposto no art.32 da Lei nº 9.307/96.

É possível, inclusive, propor que essa segurança e confiabilidade no procedimento em discussão seja corroborada por meio da assistência do Sindicato e pela atuação e fiscalização do Ministério Público do Trabalho.

Conforme verificado, se trata de um tema controverso e de grande relevância, haja vista os prós e contras da legitimação e efetivação da arbitragem nos conflitos individuais trabalhistas. Entretanto, diante da fundamentação exposta e de nosso cenário atual, se verifica que é necessária e indispensável a exploração de meios alternativos de resolução de conflitos, eis que a demora da Justiça e, por vezes, a ineficácia do processo, gera insatisfação de todos os envolvidos e, por consequência, ao Poder Judiciário.

É preciso se discutir meios alternativos. É preciso se discutir a Arbitragem.

Autor (a): Elisa Zafalão – Advogada, graduada pela Universidade Federal de Goiás – UFG e Pós-Graduanda em Direito Público pela Instituição Damásio Educacional, atuante nas áreas Cível e Administrativo. Email: elisazafalao@gmail.com.

A advogada Elisa Zafalão escreve periodicamente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna da Zafalão”.

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