01 set 2011

DECISÃO DO PERITO DO INSS PREVALECE SOBRE A DO MÉDICO DO TRABALHO

1 comentário.
Vídeo-aula sobre esse texto:

 

Prezados leitores.
Há algum tempo que venho escrevendo sobre a soberania da decisão do Médico Perito do INSS com relação à decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”. Elenco aqui alguns links para tais textos:
http://bit.ly/nucTcI
http://bit.ly/o2YJuJ
http://bit.ly/pH5boc

Muitos dirão: “mas essa tese afronta a autonomia do ato médico praticado pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, e portanto fere o Código de Ética Médica.” Senhores, toda autonomia profissional é balizada pela legislação vigente. Toda! Por exemplo, o juiz tem autonomia para julgar como quer, mas se afrontar a lei, terá sua sentença revista e poderá responder administrativamente e judicialmente. O engenheiro tem autonomia para projetar como quiser, mas se ferir a lei, também responderá por isso. Até os jornalistas tem autonomia para falar o que desejarem, mas se violarem as leis, poderão ser punidos.

Da mesma forma é o ato médico. O profissional médico goza de plena autonomia para tomar a conduta que melhor julgar em prol do seu paciente, desde que não ultrapasse os limites legais estabelecidos.

Enfim, a autonomia profissional jamais deu o direito de alguém exercer sua profissão fazendo tudo que quiser, e como quiser, mesmo que cheio de boas intenções. Graças a Deus que é assim! Os limites são necessários sempre. Fazendo uma maldosa (porém verdadeira) analogia, autonomia profissional (de qualquer profissão) é como liberdade de zoológico: você tem a liberdade que quiser, desde que não saia da jaula.

Falando agora de legislação, reitero abaixo os fundamentos pelos quais acredito que a decisão do Médico Perito do INSS se sobrepõe a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”.

A Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7) assim nos traz no item 7.4.4.3: “o ASO (atestado de saúde ocupacional) deverá conter no mínimo: (e) definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu”. Uma análise literal da norma supra nos mostra que essa definição de aptidão / inaptidão é prerrogativa do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, a quem coube a função legal de emitir o ASO.

No entanto, a Lei 11.907 / 2009, em seu Artigo 30, parágrafo 3, assim coloca: “compete privativamente aos ocupantes do cargo de Perito Médico Previdenciário ou de Perito Médico da Previdência Social …, em especial a: (I) emissão de parecer conclusivo quanto à capacidade laboral para fins previdenciários.”

Verifica-se aqui, o que no estudo do Direito recebe o nome de ANTINOMIA, ou seja, a presença de duas normas conflitantes, gerando dúvidas sobre qual delas deverá ser aplicada ao caso singular. No caso em tela, a Lei 11.907 / 2009 goza de uma posição hierárquica privilegiada, uma vez que se classifica como Lei Federal Ordinária, enquanto que a NR-7 foi editada por força da Portaria do MTE n. 24 / 1994.

Outras normativas corroboram no sentido de que a decisão do Médico Perito do INSS deva prevalecer sobre a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”:

Súmula 32 do TST: “Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.”

Comentário: percebam que aptidão ao trabalho é conferida pela cessação do benefício previdenciário definida pelo Médico Perito do INSS e não pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”. Lembramos também que o abandono de emprego é considerado uma “justa causa” de rescisão do contrato de trabalho, conforme Art. 482 da CLT.

Lei 605 / 49, Art. 6, Parágrafo 2º: “A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”

Comentário: essa lei deixa clara a hierarquia existente entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. Nessa hierarquia, o atestado de médico da instituição da previdência social prevalece sobre o atestado de médico da empresa ou por ela designado (Médico do Trabalho ou “Médico Examinador”).

Súmula 15 do TST: “A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos, estabelecida em lei.”

Comentário: em outras palavras, essa Súmula diz que deve ser obedecida a ordem trazida pela Lei 605 / 49, isto é, primeiro a decisão do Médico Perito do INSS, para só depois, a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”.

Na mesma linha, transcrevo abaixo uma matéria veiculada pelo TRT-MG. O texto refere-se a uma decisão judicial que estabelece que a empresa não pode impedir retorno de empregado ao trabalho após alta do INSS:

“Se o empregado, após receber alta do INSS, tenta retornar às suas funções e a empresa nega-se a aceitá-lo porque exames internos o declaram inapto para o trabalho, a empregadora é responsável pelo pagamento dos salários, desde o afastamento do empregado até a concessão do novo benefício previdenciário.

Isso porque, cabia à empregadora, no mínimo, readaptar o trabalhador em função compatível com sua condição de saúde e não, simplesmente, negar-lhe o direito de retornar ao trabalho.

A decisão é da 9a Turma do TRT-MG que, acompanhando o voto do juiz convocado Ricardo Marcelo Silva, julgou desfavoravelmente o recurso da reclamada, mantendo sua condenação ao pagamento dos salários e verbas trabalhistas do período em que o reclamante não foi aceito pela empregadora. A empresa sustentou em seu recurso que não poderia permitir que um trabalhador doente reassumisse as suas funções, sob pena de ser responsabilizada por um dano maior. No seu entender, a prova de que o médico da empresa tinha razão está no fato de o INSS ter concedido novo benefício previdenciário ao trabalhador. A ré alegou ainda que, se não houve trabalho, não pode haver salário.

Mas, conforme explicou o relator, o reclamante foi encaminhado à Previdência Social em julho de 2008, mas teve o seu pedido de auxílio-doença negado, porque a autarquia não constatou incapacidade para o trabalho. O seu pedido de reconsideração da decisão também foi negado, pela mesma razão. Foram feitos novos encaminhamentos, com requerimento do benefício previdenciário, todos sem sucesso. Como o reclamante foi considerado apto para o trabalho pelo órgão competente, ele se apresentou na empresa para reiniciar a prestação de serviços, mas foi impedido de retornar.

Para o magistrado, a conclusão da autarquia previdenciária é a que deve prevalecer, porque as declarações do órgão têm fé pública, não sendo o caso de se discutir, nesse processo, se houve equívoco na decisão do INSS. Por isso, empresa deveria ter readaptado o trabalhador em funções compatíveis com a sua saúde e não impedi-lo de voltar ao trabalho. “Relevante, de todo modo, é que o autor permaneceu à disposição da ré e que partiu desta a iniciativa de obstar o retorno ao emprego – como, aliás, se infere das próprias razões recursais.

O salário do empregado não podia ficar descoberto até que o órgão previdenciário, mesmo reconsiderando decisão anterior, concedesse o benefício” – finalizou. (RO nº 01096-2009-114-03-00-4).

(Fonte: TRT/MG 14/06/2010 – adaptado pelo Guia Trabalhista)”

Oportuno ratificar que a submissão legal do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” jamais pode ser confundida com negligência médica. Isto é, o fato de o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” ter que acatar (mesmo não concordando) a decisão do Médico Perito do INSS por imposição legal, não o afasta do cuidado com o trabalhador em nenhuma hipótese. Sobre tal situação, proponho algumas condutas através do texto que pode ser visualizado pelo link: http://bit.ly/pH5boc

Um forte abraço a todos e até terça-feira (06/09), data provável para postagem de um novo texto nesse blog.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha
E-mail: marcos@asmetro.com.br
Twitter: @marcoshmendanha

 

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