20 jun 2011

PERITO DÁ APTO E MÉDICO DO TRABALHO DÁ INAPTO. E AGORA?

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Vídeo-aula sobre esse texto:


Prezados leitores.Um dos maiores problemas na prática da Medicina do Trabalho se estabelece quando: o Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, após ter qualificado o empregado como “inapto” à determinada função, o encaminha para o serviço de Perícias Médicas do INSS, sugerindo, mediante atestado médico, determinado lapso de tempo para respectivo tratamento e recuperação.O Médico Perito do INSS, por sua vez, após concessão de benefício previdenciário por um prazo menor do que o sugerido pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, qualifica este empregado como “capaz” para retorno às suas atividades laborais. Qual a conduta mais apropriada do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” a partir daí, com relação ao empregado, a empresa, e ao INSS?A Norma Regulamentadora n. 7 (NR-7) assim nos traz no item 7.4.4.3: “o ASO (atestado de saúde ocupacional) deverá conter no mínimo: (e) definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu”. Uma análise literal da norma supra nos mostra que essa definição de aptidão / inaptidão é prerrogativa do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, a quem coube a função de emitir o ASO.No entanto, a Lei 11.907 / 09, em seu Artigo 30, parágrafo 3, assim coloca: “compete privativamente aos ocupantes do cargo de Perito Médico Previdenciário ou de Perito Médico da Previdência Social …, em especial a: (I) emissão de parecer conclusivo quanto à capacidade laboral para fins previdenciários.”Verifica-se aqui, o que no estudo do Direito recebe o nome de antinomia, ou seja, a presença de duas normas conflitantes, gerando dúvidas sobre qual delas deverá ser aplicada ao caso exemplificado. No caso em tela, a Lei 11.907 / 09 goza de uma posição hierárquica privilegiada em nosso ordenamento jurídico, uma vez que se classifica como Lei Federal Ordinária, enquanto que a NR-7 foi editada por força da Portaria do MTE n. 24 / 1994. Sendo assim, deve prevalecer a Lei 11.907 / 09.Outras normativas corroboram no sentido de que a decisão do Médico Perito do INSS deva, legalmente, prevalecer sobre a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”:

Súmula 32 do TST: “Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.”

Nosso comentário: vemos que aptidão ao trabalho é conferida pela cessação do benefício previdenciário definida pelo Médico Perito do INSS, e não pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”. Lembramos também que o abandono de emprego é considerado uma “justa causa” de rescisão do contrato de trabalho, conforme art. 482 da CLT.

Lei 605 / 49, art. 6, parágrafo 2º: “A doença será comprovada mediante atestado de médico da instituição da previdência social a que estiver filiado o empregado, e, na falta deste e sucessivamente, de médico do Serviço Social do Comércio ou da Indústria; de médico da empresa ou por ela designado; de médico a serviço de representação federal, estadual ou municipal incumbido de assuntos de higiene ou de saúde pública; ou não existindo estes, na localidade em que trabalhar, de médico de sua escolha.”

Nosso comentário: essa lei deixa clara a hierarquia existente entre os atestados médicos para fins de abonos de faltas ao trabalho. Nessa hierarquia, o atestado de médico da instituição da previdência social prevalece sobre o atestado de médico da empresa ou por ela designado (Médico do Trabalho ou “Médico Examinador”).

Súmula 15 do TST: “A justificação da ausência do empregado motivada por doença, para a percepção do salário-enfermidade e da remuneração do repouso semanal, deve observar a ordem preferencial dos atestados médicos, estabelecida em lei.”

Nosso comentário: em outras palavras, essa Súmula diz que deve ser obedecida primeiro a decisão do Médico Perito do INSS, para só depois, a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”.

Por toda fundamentação legal exposta na situação exemplificada na introdução deste texto, ao receber esse empregado do serviço de Perícias Médicas do INSS, nosso entendimento é de que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” deverá:

>> explicar ao trabalhador todas as repercussões (inclusive legais) do impasse instalado;

>> enfatizar junto ao empregado sobre todos os possíveis riscos à saúde advindos do seu ambiente de trabalho, nos termos dos Artigos 12 e 13 do novo Código de Ética Médica;

>> orientar e auxiliar esse segurado quanto a interposição de pedido de reconsideração (PR) ou recurso junto ao INSS, explicando-lhe todas as possíveis consequências de cada possibilidade;

>> orientar e auxiliar esse segurado quanto a possibilidade de ação judicial em face da decisão proferida pelo serviço de perícias médicas do INSS, também explicando-lhe as possíveis repercussões;

>> enquanto vigorar a discordância com o serviço de perícias médicas do INSS, deverá considerar o empregado “apto” ao trabalho, revogando, inclusive, o seu próprio atestado, já emitido quando do encaminhamento inicial do empregado ao INSS. Nesse período de impasse, não há sustentação legal para que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” (que age como se empresa fosse, conforme interpretação extraída do art. 932, inciso III, do novo Código Civil) confronte a decisão do Médico Perito do INSS, não recepcione esse empregado no trabalho, e ainda o mantenha afastado (especialmente, sem o pagamento do respectivo salário desse trabalhador). Sobre o tema, assim se posicionou o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais / MG (RO nº 01096-2009-114-03-00-4):

EMENTA: AFASTAMENTO DO EMPREGADO. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INAPTIDÃO DECLARADA PELO MÉDICO DA EMPRESA. Comprovada a tentativa do autor de retornar ao trabalho e atestada a sua capacidade pela autarquia previdenciária, cabia a reclamada, no mínimo, readaptar o obreiro em função compatível com a sua condição de saúde, e não simplesmente negar-lhe o direito de retornar ao trabalho, deixando de lhe pagar os salários. Como tal providência não foi tomada, fica a empregadora responsável pelo pagamento dos salários e demais verbas do período compreendido entre o afastamento do empregado e a efetiva concessão do beneficio previdenciário.

Portanto, além da devida documentação em prontuário médico, sugerimos que esse ASO de aptidão vá acompanhado de um documento que apresente a seguinte redação:

“O paciente ____ , RG _____ , teve o pedido de prorrogação (PP) indeferido, e/ou pedido de reconsideração (PR) indeferido, e/ou término de seu auxílio-doença em __/__/__. Diante do exposto, com fulcro no Artigo 482, alíneas “e” e “i” da CLT, combinado com Súmulas 15 e 32 do TST, e nas Leis 11.907 / 09 (art. 30, inciso I) e 605 / 49 (art. 6, parágrafo 2), sem outra alternativa de conduta, me submeto à decisão do INSS, e o qualifico como apto para retorno ao trabalho, com as devidas recomendações, enquanto se aguarda resposta ao pedido de reconsideração (PR) / recurso / nova perícia / decisão judicial. Recomendações: _____ .”

No entanto, sabemos que, na prática, muitas vezes, as “recomendações” (que muitos colegas preferem caracterizar com o uso do termo “restrições”) solicitadas praticamente se equivalerão à própria inaptidão desse empregado. Por isso, a partir de então, o bom senso e a boa habilidade de diálogo do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” junto ao empregado, ao empregador e ao INSS é que definirão a melhor conduta a ser tomada, sempre visando o bem maior: a preservação da dignidade, e da saúde do trabalhador (princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado pelo art. 1o, inciso III da Constituição Federal de 1988). Sugerimos algumas possíveis condutas:

>> quanto ao INSS: caso haja possibilidade de aproximação com o serviço de perícias médicas do INSS no sentido de viabilizar uma solução para o caso, o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” deverá fazê-lo;

>> quanto ao empregador: nosso entendimento está firmado no sentido de que o empregador precisa entender toda essa problemática, com todos os seus fundamentos legais, e também as prováveis repercussões em casos de processos judiciais futuros. Assim, o ideal, é que haja um posto de trabalho inócuo (não nocivo) à saúde do trabalhador, e que o empregado atue por lá enquanto não estiver no pleno de sua capacidade laboral (do ponto de vista do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”). Isso não deve ser confundido com o chamado “desvio de função”, comumente usado para fins de pagamentos de menores salários. No caso em questão, o motivo da mudança da atividade laboral se justifica pela preservação da dignidade do empregado, uma garantia constitucional. A manutenção do empregado na mesa função (caso haja possibilidade de agravamento da doença / acidentes) deve ser fortemente contraindicada. Além dos riscos indesejáveis ao trabalhador, caso haja algum dano, o próprio empregador poderá ser penalizado com fulcro nos artigos 129 e 132 do Código Penal, e 927 do novo Código Civil. Dessa forma, não havendo algum ambiente inócuo em que se possa acomodar o empregado durante sua completa convalescença, até mesmo a permanência do empregado em sua própria residência, sem o desconto no respectivo salário (situação em que a falta será considerada justificada, conforme art. 131 da CLT) deverá ser considerada pelo empregador.

Na vigência do impasse entre Médico Perito do INSS e Médico do Trabalho, a empresa poderá dispensar esse empregado?

Sendo considerado “capaz” pelo Médico Perito do INSS, a dispensa do empregado (rescisão do contrato de trabalho, sem justa causa), em tese, está permitida por lei. Lembremos que de forma submissa ao INSS o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” terá que considerá-lo “apto” para retorno ao trabalho, logo, também estaria “apto” num eventual exame demissional que fizesse. Ratificamos que os critérios seguidos pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, em todos os exames ocupacionais (admissional, periódico, demissional, etc.), devem ser os mesmos para que não haja avaliações discriminatórias, com “dois pesos e duas medidas”. No entanto, mesmo com a possibilidade legal da dispensa arbitrária (sem justa causa) desse empregado pelo empregador, entendemos que tal conduta deva ser muito bem pensada (veja nossa proposta de conduta em outro texto desse blog, link: http://bit.ly/rdHf0n ). Há exemplos de empregados dispensados que, mesmo estando “aptos” pelo Médico Perito do INSS, e pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador” no exame demissional, alegaram judicialmente que não poderiam ter sido desligados da empresa naquele momento por questões relacionadas à saúde, e obtiveram indenizações favoráveis (conforme melhor elucidamos em outro texto desse blog, leia AQUI).

Vale lembrar que a Justiça do Trabalho considera o empregado como a parte hipossuficiente na relação de trabalho, o que demanda uma série de precauções a serem tomadas pelo empregador na construção de sua própria segurança jurídica.

Inequivocamente, para explorarmos as situações mais dramáticas do nosso cotidiano, na situação exposta ao longo de todo esse texto, praticamente desconsideramos as possibilidades de sucesso dos pedidos de reconsideração (PR) junto ao INSS, e até mesmo das sentenças favoráveis ao empregado em ações judiciais instauradas.

Concluindo: legalmente, com relação à aptidão laboral, a decisão do Médico Perito do INSS deve prevalecer sobre a decisão do Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, por mais polêmico que isso seja. No entanto, o assunto extrapola as balizas legais fazendo com que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” assuma uma posição de destaque na conciliação de todos os atores envolvidos: empregado, empregador e INSS. Oportuno ratificar que a submissão legal do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” jamais pode ser confundida com negligência médica. Isto é, o fato de o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” ter que acatar (mesmo não concordando) a decisão do Médico Perito do INSS, por obediência legal, não o afasta do cuidado com o trabalhador em nenhuma hipótese. Numa tentativa de sempre sintonizar as condutas entre Médico Perito do INSS, e Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, sugerimos a leitura de outro texto desse blog, clique AQUI.

O Médico do Trabalho que, mesmo não concordando, se submete à decisão do Médico Perito do INSS tem sua autonomia afrontada?

Muitos dirão: “a sugestão de conduta proposta ao longo desse texto afronta a autonomia do ato médico praticado pelo Médico do Trabalho, e, portanto, fere o Código de Ética Médica.” Lembremos que toda autonomia profissional é balizada pela legislação vigente. Toda! Por exemplo, o juiz de direito tem autonomia para julgar como quer, mas se afrontar alguma lei, terá sua sentença revista e poderá responder administrativamente e judicialmente. Os jornalistas têm autonomia para falar o que desejarem, mas se violarem as leis, poderão ser punidos. Enfim, nem o próprio Presidente da República goza de autonomia plena, também tendo seu exercício balizado legalmente. Quanto ao médico, por que a regra seria diferente? O próprio Código de Ética Médica dedica o maior número de suas páginas restringindo a autonomia dos médicos. Tanto é assim, que dos 14 capítulos do novo código, 11 começam com o dizer “é vedado ao médico…”, o que em outras palavras significa: o médico não tem autonomia para…

Para exemplificar melhor: a regra do Código de Ética Médica é o sigilo das informações obtidas quando do exercício profissional. Porém, o art. 73 do mesmo código faz ressalvas à obrigatoriedade desse sigilo, incluindo entre as causas o “dever legal” de se revelar as informações obtidas no ato médico. Isso implica dizer que, para que se cumpra a lei, dependendo do caso, o médico não tem autonomia para guardar determinadas informações de seus pacientes sob sigilo profissional pleno.

Importante lembrar que, pelas regras do nosso ordenamento jurídico, as leis possuem hierarquia privilegiada e devem prevalecer sobre às resoluções profissionais (como é o caso do próprio Código de Ética Médica), quando em eventuais conflitos entre essas normas (antinomia).

Em suma, o profissional médico goza de plena autonomia para tomar a conduta que melhor julgar em prol do seu paciente, desde que não ultrapasse os limites legais estabelecidos. A autonomia profissional jamais deu o direito de alguém exercer sua profissão fazendo tudo que quiser, e como quiser, mesmo que cheio de ótimas intenções. Que bom que seja assim! Os limites são necessários, sempre. Cabe aqui uma chocante (porém verdadeira) analogia: autonomia profissional (de qualquer profissão) é como liberdade de zoológico, ou seja, o profissional tem a liberdade que quiser, desde que não saia da jaula (aqui representando os limites legais).

Por todo exposto, concluímos que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” que, mesmo não concordando, se submete à decisão do Médico Perito do INSS, o faz, acima de tudo, por correto cumprimento do seu dever legal. A autonomia do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” deve ser sempre respeitada, desde que não ultrapasse os limites legais estabelecidos.

Quais as conseqüências possíveis para o Médico do Trabalho que, discordando da conduta do Médico Perito do INSS, faz valer sua própria decisão?

Mais uma vez, ressaltamos que não defendemos uma concordância “cega” e inconseqüente do Médico do Trabalho / “Médico Examinador” para com o Médico Perito do INSS. Muito pelo contrário! O que propomos é que, na vigência do impasse, a decisão do Médico Perito do INSS seja acatada pelo Médico do Trabalho / “Médico Examinador” por uma questão legal (conforme já vimos de forma fundamentada), e que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” assuma uma posição mediadora entre empregador, empregado e INSS, sempre defendendo a saúde do trabalhador. Nesse contexto, por exemplo, se o Médico Perito do INSS concedeu capacidade laboral ao trabalhador, e o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” entenda que não há essa capacidade, poderá considerá-lo: (a) “apto com recomendações”, ou (b) “apto com contraindicação à função”, conforme sugerimos em outro texto desse blog, leia AQUI.

Conforme já colocado nesse texto, e aqui enfatizado, até mesmo um maior tempo de repouso do empregado, em sua própria residência, mediante remuneração do empregador, deve ser considerado. Obviamente que, em todas essas situações, o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” deverá sair de seu consultório e se tornar um eficaz gerenciador de conflitos, um mediador de calorosos diálogos. Deverá explicar, tanto ao empregador, quanto ao trabalhador, toda legislação (já mostrada nesse texto) e demais repercussões referentes a esse tema. Talvez seja essa a dificuldade de muitos médicos, e é justamente deles que a sociedade mais necessita.

Muitos dirão: “legalmente esse texto está correto, mas o Médico do Trabalho jamais deve se submeter à decisão do Médico Perito do INSS, caso não concorde com essa decisão”. Obviamente que o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” tem todo direito de não concordar com a conduta que sugerimos nesse texto. Mas quando esse profissional reconhece que os fundamentos legais estão corretos, na verdade, não está discordando desse texto, mas das leis do nosso país. Apenas fazendo uma analogia, é provável que muitos não concordem com o elevado imposto de renda que pagamos… e mesmo assim pagamos. Por que? Pois trata-se de uma questão legal, e sua não obediência traz conseqüências indesejáveis. Assim, uma coisa é não concordar e lutar para que as leis se modifiquem. Outra coisa, bem diferente, é não cumprir as leis estabelecidas, de forma deliberada. Se a moda pega, instala-se de fato a anarquia. Que Deus nos livre disso.

Alguns ainda sustentarão: “é uma falta de responsabilidade e negligência do Médico do Trabalho conferir aptidão laboral a alguém, apenas por obediência à decisão do Médico Perito do INSS”. Falando em responsabilidade, imaginemos então que um Médico do Trabalho / “Médico Examinador” insista em qualificar como “inapto” um trabalhador que acaba de retornar do INSS com a capacidade laboral reconhecida. Mesmo sendo uma conduta ilegal (conforme fartamente exposto nesse texto), essa conduta poderia até ser qualificada como “parcialmente responsável”, uma vez que se reveste de uma ótima (e verdadeira) intenção: a proteção da saúde do trabalhador.

No entanto, para que essa conduta seja qualificada como “completamente responsável”, o Médico do Trabalho / “Médico Examinador” deverá também alertar o trabalhador sobre todos os riscos dessa “ilegalidade muito bem intencionada”, num discurso completo, parecido com esse: “Sr. Trabalhador, o Perito do INSS entende que o Senhor pode voltar ao trabalho, mas eu discordo e o qualificarei como ‘inapto’ (descumprindo assim a Leis 605 / 49 e a Lei 11.907 / 09). Sendo assim, fique em sua residência até sua saúde melhorar por completo. Não se preocupe, pois se nem a Justiça, e nem o INSS reconhecerem seu benefício; e também o empregador não concordar em pagar o seu salário integral durante sua ausência (conforme permitido pela interpretação do art. 60, parágrafo 3o, da Lei 8.213 / 91), eu mesmo pagarei. Mais do que isso: se em virtude das muitas faltas ao trabalho, o Senhor for dispensado do emprego por justa causa (nos termos do art. 482, alíneas “e” e “i”, da CLT), eu mesmo vou pagar o seu acerto como se fosse uma dispensa sem justa causa, ou seja, o Senhor não perderá os seus direitos.” Fica então a pergunta: vale a pena o Médico do Trabalho / “Médico Examinador”, mesmo que cheio de ótimas intenções, agir de forma ilegal, afrontar a decisão do Médico Perito do INSS, e assumir todas as conseqüências disso?

Pra finalizar esse tópico, é muito comum ouvirmos pacientes que regressam de uma perícia médica do INSS dizendo: “o médico nem me examinou”. É bom lembrarmos que essa afirmação está vindo, quase sempre, de alguém que teve sua pretensão resistida. Pode ser absolutamente verdadeira, mas também pode não ser. Independente da especialidade dos médicos que leem esse texto, sugerimos que esses profissionais façam ocasionalmente uma avaliação anônima dos seus próprios atendimentos. Muitos se surpreenderão! Por melhores que sejam esses médicos, alguns pacientes reprovarão suas condutas e relações interpessoais. Alguns os criticarão impiedosamente. Muitos também dirão: “esse médico nem me examinou”. Mas isso não será motivo para culpas e intranquilidades! O fato é que jamais qualquer médico conseguirá agradar a todos a quem atende. Jamais! Conforme o secular ditado, “o médico só pode se considerar maduro e experiente quando, ciente de todas as insatisfações dos seus pacientes, consegue amá-los cada dia mais.” Esse deve ser o caminho dos que escolheram a medicina como ofício.

Com todo respeito às opiniões divergentes, esse é o meu raciocínio.

Um forte abraço a todos!

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha

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