25 mar 2020

Como o empregador deve agir para preservar a saúde dos empregados sem violar direitos

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Em razão da extrema gravidade da situação que envolve a propagação do coronavírus e os riscos que esta espécie de gripe traz à saúde da população, o Governo Federal publicou, em caráter emergencial, a Lei 13.979/20, que “Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019, visando a proteção da coletividade (art.1º, §1º)”. No artigo 3º, estão descritas as medidas que podem ser adotadas.

Entretanto, não cabe ao empregador impor a seus empregados situações de quarentena, isolamento ou realização aleatória de exames médicos. Tal responsabilidade incumbe ao médico do trabalho, em caso de suspeita de contágio. Cabe a ele orientar os empregados a procurarem a Vigilância Sanitária e demais órgãos públicos para a realização de exames. Sendo assim, em caso de suspeita de contágio, a empresa deve orientar os seus empregados a buscar atendimento com médico do trabalho para a avaliação adequada.

Importante atentar que a Lei, em seus artigos 5º e 6º, parágrafo 1º, obriga o compartilhamento das informações sobre o conhecimento de pessoas infectadas ou a circulação destes em locais públicos e/ou privados. No entanto, o médico do trabalho deve comunicar apenas às autoridades, tratando o diagnóstico de forma sigilosa no ambiente de trabalho do empregado, nos termos das normas regulamentadoras aplicadas e às diretrizes dos Conselhos Regionais de Medicina. Ou seja, deve preservar a identidade e os dados sensíveis dos envolvidos nos termos da Lei 13.709/2018 — Lei Geral de Proteção de Dados. Assim, havendo a constatação da presença de sintomas, o médico deve orientar e requerer a realização de exames ao empregado, o qual correrá sem informação direta à empresa.

É necessário esclarecer que cada caso deve ser analisado individualmente no que tange à ausência do empregado, procedimento de comunicação deste para com a empresa etc. Analisemos algumas situações.

Faltas
Além das previsões legais para o abono de falta ao trabalho, a Lei 13.979/20 prevê também o abono de faltas em face da pandemia de coronavírus. Entretanto, da mesma forma que ocorre em qualquer consulta médica, o empregado deve comprovar a sua ausência ao trabalho através de atestado médico ou apresentar elementos que lhe abstenham legitimamente de comparecer ao trabalho em determinado dia.

Como se trata de situação que envolve aspectos humanitários, eventuais atrasos de empregados devem ser analisados caso a caso, pois escolas vêm suspendendo aulas e pessoas se deslocam para postos de saúde etc. Este quadro pode vir a acarretar transtornos também à rotina dos empregados.

Imperativo esclarecer que o empregado tem o dever de se preservar e de procurar auxílio médico em caso de apresentar sintomas claros da doença ou se tiver parentes próximos com a doença e/ou sintomas. Ou, ainda, se manteve contato com alguém nestas condições. Em caso de omissão, sabendo da sua condição clínica positiva para coronavírus, ele pode ser demitido por justa causa e ainda responder por crime contra a saúde pública, no termos do artigo 3º, parágrafo 4º, da Lei 13.979/20.

De forma geral, se o empregado se negar a adotar medidas de segurança e higiene comum a todos, como o uso de álcool gel, higienização periódica de mãos etc., tal recusa equivale a não uso deliberado de equipamento de proteção individual (EPI). Nesta hipótese, ele está sujeito à demissão por justa causa.

Força maior
Trata-se de um caso de rara ocorrência, mas tem de ser debatido. Registra o artigo 501, da CLT: “Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente”.

Nos casos de força maior ou ainda em casos de prejuízos devidamente comprovados, a legislação trabalhista prevê a possibilidade de redução salarial temporária proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25%, respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região. Entretanto, ainda que não previsto no respectivo artigo, a Constituição, em seu artigo 7º, inciso XIII, exige a existência de acordo ou convenção coletiva para tanto. Previsão semelhante traz o artigo 2º da Lei 4.923/65.

Férias
Diante da pandemia em que nos encontramos, a licença remunerada ou férias coletivas podem ser uma alternativa para atender a necessidade de manutenção da cadeia produtiva das empresas.

No caso das férias coletivas (para toda empresa ou para alguns setores), embora esteja prevista a necessidade de comunicação com antecedência de 30 dias, se o empregador arcar com os valores antecipadamente, acredita-se que, por se tratar de situação que envolve questão de saúde pública, eventual discussão no Judiciário será minimizada. Em que pese não atenda o prazo previsto em Lei, as férias devem ser comunicadas ao Ministério da Economia.

Para concessão das férias coletivas sem obedecer ao prazo legal, novamente o acordo coletivo emergencial e temporário com o sindicato dos trabalhadores, com cláusulas exclusivas para o período de pandemia, se torna imprescindível, a fim de salvaguardar a empresa de ações trabalhistas futuras.

Licença remunerada
Ainda que não favoreça, à primeira vista, o empregador, outra alternativa é a licença remunerada. Essa poderá ser dada ao empregado afastado por razão de quarentena ou isolamento. Este deve receber os salários dos dias de afastamento e ter suas faltas abonadas. Entretanto, se perdurar por mais de 30 dias o afastamento, o empregado perderá o direito às férias proporcionais do período aquisitivo.

Empregado e empregador, de forma livre, poderão fazer ajustes, para que ninguém saia prejudicado. Por exemplo: o período de licenciamento pode ser usado como compensação das horas extras anteriormente laboradas. Ao retornar da licença remunerada, empregado também poderá ter a opção de realizar duas horas extras diárias por um período de 45 dias, para fim de compensar o período de afastamento/isolamento.

Home office
Uma das medidas sugeridas para evitar a aglomeração de pessoas é o home office ou teletrabalho, definido como a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação. Dada a sua natureza, não se constituam em trabalho externo.

O home office é uma alternativa que a Reforma Trabalhista trouxe para regular a realidade de muitas empresas que já se utilizam dessa forma de contratação. Numa situação de pandemia, é uma saída para os empregadores não perderem, ou não reduzirem, a mão de obra e a produtividade.

Entretanto, conforme dispõe a legislação, a implantação desta modalidade de trabalho necessita de mútuo consentimento, uma vez que o empregado não é obrigado a aceitar esta condição. Para tanto, se aconselha que haja aditivo contratual com esta previsão, ou novamente uma negociação coletiva para o período de pandemia.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) orienta que, no caso de uma situação de emergência eventual, a adoção do trabalho remoto deve ter caráter temporário, sem prescindir de algumas etapas formais — desde que respeitados os limites estabelecidos na legislação trabalhista e no contrato de trabalho. Assim, embora temporariamente o empregado esteja trabalhando em casa, o local contratual da prestação do serviço continua sendo o endereço da empresa.

Rodízio de empregados
Outra alternativa a ser adotada seria o rodízio de empregados, para o fim de tentar expor o mínimo possível todos os colaboradores da empresa. Importante salientar que a contaminação do empregado pode ser considerada doença ocupacional (artigo 19 da Lei 8.213/91). Claro, desde que contraída dentro da empresa e comprovada a responsabilidade do empregador pela contaminação, por omissão de medidas protetivas a proliferação do vírus, nos termos da Lei Previdenciária.

É vital destacar que nos casos de afastamento por mais de 15 dias, mesmo em caso de contágio pelo Covid-19, aplicam-se as disposições gerais para licença por motivo de saúde. Neste caso, os trabalhadores filiados ao Regime Geral de Previdência Social, incapacitados para o trabalho ou para sua atividade habitual por mais de 15 dias, têm direito ao auxílio-doença. Durante os primeiros 15 dias consecutivos de afastamento, cabe ao empregador pagar ao empregado. Após 16º dia, esta obrigação passa a ser cumprida pelo INSS. Os demais filiados, como prestadores de serviço, profissionais autônomos e outros contribuintes para a Previdência, também podem acionar o INSS para ter direito ao auxílio-doença.

Por fim, orienta-se que a empresa intensifique um programa de prevenção ao contágio, por meio de cartazes, intranet e/ou folhetos explicativos. Também deve disponibilizar, de forma duradoura, álcool gel nas suas dependências, mantendo sempre arejado e higiênico o local de trabalho. Por fim, se possível, criar um canal direto que facilite o contato com médicos e clínicas de Medicina do Trabalho.

 

Fonte: Conjur.com.br

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