24 mar 2020

Impactos do coronavírus nas relações de trabalho

postado em: Saúde do Trabalhador

Nenhum comentário.

Na última sexta-feira 13, superstições à parte, os Poderes Executivo e Judiciário tomaram diversas medidas de prevenção e contenção à pandemia ocasionada pelo coronavírus (COVID-19). Dentre as medidas tomadas, podemos citar, de forma bem resumida, algumas que afetam as relações de trabalho (empregos, associações e sociedades) de forma geral e especialmente determinados setores empresariais, tais como: suspensão das aulas em instituições de ensino públicas e privadas, suspensão de shows, espetáculos teatrais e exibição de filmes em cinemas, suspensão de audiências e sessões de julgamento, recomendação de funcionamento alternado de varas do trabalho1, dentre outros… e tudo isso de modo a promover o isolamento social no claro intuito de proteger a saúde e garantir atendimento hospitalar adequado à população brasileira.

Dúvidas não há de que estamos atravessando estado de alerta grave e emergencial decorrente da forma arrebatadora como o coronavírus resolveu, sem cerimônias, espalhar-se mundo à fora.

Sensíveis a esta situação, TODOS os Tribunais Superiores baixaram medidas de restrição ao trabalho, especialmente presencial e destinadas a evitar aglomerações de pessoas, restringindo o acesso a salas de audiência e sessões de julgamento, bem como instituindo o teletrabalho para idosos e servidores que tenham regressado de viagens a localidades em que o surto tenha sido reconhecido. Para tanto, basta consultar a resolução 663, de 12 de março de 2020 do STF, a portaria STJ/GP 82, de 11 de março de 2020 e os atos 110 e 122/20, ambos do TST.

Vale destacar que o art. 3º da lei 13.979/20, regulamentada pela portaria 356/20, do Ministério da Saúde elenca algumas medidas que poderão ser adotadas, entre outras, para enfrentar essa situação de emergência, merecendo destaque e sem exauri-las, as seguintes: (i) isolamento; (ii) quarentena e determinação compulsória de exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clínicas, vacinação e tratamentos médicos específicos, além de (iv) restrição excepcional e temporária de entrada e saída do País, (v) requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas.

Desse modo, infere-se que garantias constitucionais importantes, a exemplo do direito de ir e vir, direito de disposição dos bens e do próprio corpo podem ser excepcionadas, ante à situação emergencial e desde que vinculada a um bem maior de proteção à saúde e vida da coletividade.

No ambiente laboral essa situação reverbera com força, trazendo algumas consequências aliadas à necessidade de adoção de medidas por parte do empregador, ante a sua obrigação de garantir a proteção da saúde e segurança dos seus empregados (art. 157 da CLT). Responsabilidade análoga terá o sócio administrador nas sociedades de trabalho, tais como escritórios de advocacia, cooperativas médicas e outras instituições semelhantes.

Nessa linha, recomenda-se fortemente a adoção do teletrabalho temporário e plenamente justificado pela determinação de isolamento social. Referida medida poderá ser adotada em toda a empresa ou apenas em setores ou funções e atividades que facilmente possam ser desempenhadas à distância do ambiente empresarial, de forma remota. Devem ser priorizados, ainda, na organização do teletrabalho, os idosos, trabalhadores com doenças respiratórias e com baixa imunidade ou que estejam submetidos a tratamentos ou ainda os que, por recomendação médica, devam evitar o contato social nesse estágio de pandemia.

Para tanto recomenda-se a criação de uma política emergencial de teletrabalho, haja vista que a implementação da medida de isolamento social para os serviços não essenciais justifica a determinação do trabalho remoto pela empresa, até mesmo sem aquiescência do trabalhador, desde que esteja ele munido de instrumentos que permitam a execução do serviço, sejam eles de propriedade do empregado ou do empregador, a combinar.

O empregador ou administrador deverá, ainda, determinar que seus empregados e associados ou sócios reportem de forma obrigatória a ocorrência de qualquer sintoma típico da doença ou de gripe, bem como o local de procedência de viagens, em caso de ausência, além de restringir viagens laborais no período dos próximos 15 dias.

Para os trabalhadores que continuarem a laborar de forma presencial, nesse período, deverá ainda ser exigida a utilização de equipamentos de proteção individual adicionais e compatíveis com a manutenção da saúde e higiene do ambiente laboral, análise que deve ser realizada por médico do trabalho, tais como: utilização de álcool gel, máscaras, luvas, uniformes especiais (principalmente na área de saúde), dentre outros.

Vale ressaltar que os empregados não podem se recusar a trabalhar, sem justificativa médica, nem a observar essas diretivas, sob pena de restar configurado ato faltoso, passível de punição (art. 158 da CLT). Da mesma forma, também os associados e sócios não poderão recusar essa observância, por ser medida de saúde pública.

Outra cautela que deve ser observada é a necessidade de notificar os terceiros prestadores de serviços no ambiente laboral acerca da responsabilidade que possuem em adotar medidas semelhantes em relação aos seus empregados, especialmente vinculadas à necessidade de os trabalhadores reportarem eventuais sintomas de gripe ou da doença, sob pena de serem responsabilizados.

Alguns setores empresariais, que lidam com o público diariamente, a exemplo de escolas, universidades, empresas de entretenimento, companhias de aviação, dentre outros, foram diretamente atingidos com uma redução de demanda. Nessas situações o teletrabalho poderia ajudar em parte. Todavia, o problema maior das empresas seria a falta de demanda aliada ao dever de honrar as suas obrigações trabalhistas2. Para esses segmentos, existem algumas possibilidades de garantir um afastamento responsável e menos oneroso, a exemplo da adoção de férias coletivas, com base no art. 139 da CLT, observada a necessidade de aviso aos órgãos da secretaria do Trabalho e aos sindicatos3. Vale destacar que a ausência de aviso antecedente de 30 dias constitui irregularidade plenamente justificável, ante o caráter emergencial de toda essa situação.

Poderá o empregador pactuar, ainda, a compensação antecipada de eventuais saldos existentes no Banco de Horas ou mesmo uma compensação posterior de horas de trabalho, em esquema a ser definido e delineado no futuro, observadas as limitações de 2 horas extras de trabalho por dia (art. 61, §3º da CLT).

É tempo de darmos as mãos, nesse caso recomenda-se “virtualmente”, de modo a evitar dicotomias, propagando-se a união, a força e a solidariedade com o colega de trabalho, com a economia de quem provém e sustenta os empregos e acima de tudo com a sociedade em geral.

 

Fonte: Migalhas.com.br

Assine a newsletter
saudeocupacional.org

Receba o conteúdo em primeira mão.