13 set 2011

SOBRE INSALUBRIDADE, APOSENTADORIA ESPECIAL E LTCAT.

14 comentários.
Prezados leitores.Pra que serve o LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho)?Em primeiro lugar, convém ressaltar que o LTCAT não foi instituído para avaliar a presença (ou ausência) de insalubridade / periculosidade, previstas nos Arts. 192 e 193 da CLT, como ouvimos com demasiada frequencia. O LTCAT é um documento que visa caracterizar (ou não) a existência de agentes nocivos à saúde do trabalhador, para fins de obtenção de aposentadoria especial, conforme Art. 58 da Lei 8.213 / 91, que assim nos traz:

“Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.

§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista.”

As regras para elaboração do LTCAT estão elencadas nos Artigos 247 e 257 da Instrução Normativa do INSS n. 45 / 2010.

Oportunamente, comento agora, com base legal, sobre dois mitos que ainda sobrevivem com acentuada força entre profissionais de saúde e segurança do trabalho.

“Toda insalubridade gera aposentadoria especial.”

Falso! Como exemplo, cito o agente físico “umidade”, que gera insalubridade (de acordo com o Anexo 10 da Norma Regulamentadora n. 15), mas não gera aposentadoria especial (conforme Anexo IV do Decreto 3.048 / 99);

“Periculosidade não gera aposentadoria especial.”

Falso! Atualmente, por exemplo, radiações ionizantes ensejam periculosidade (e não insalubridade), por força da Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego n. 518 / 03. Por sua vez, radiações ionizantes podem implicar em aposentadoria especial (conforme Anexo IV do Decreto 3.048 / 99).

“Insalubridade / periculosidade” e “aposentadoria especial” quase sempre andam juntas em suas análises. São gêmeas, mas bivitelinas. “Insalubridade / Periculosidade” é assunto para o Ministério do Trabalho e Emprego. “Aposentadoria especial” é assunto para o INSS.

Por já ter se tornado costumeiro, o LTCAT pode até concluir pela presença (ou não) de insalubridade / periculosidade, conforme preconizado nas NR-15 e NR-16, respectivamente. No entanto, o maior pecado de um LTCAT será o de omitir em sua sua conclusão se houve (ou não) enquadramento dos riscos analisados entre aqueles capazes de gerar a aposentadoria especial, nos termos do Anexo IV do Decreto 3.048 / 99. Já dizia o sábio jargão popular: “uma coisa é uma coisa… outra coisa é outra coisa.”

Pois bem, outro dia fui procurado por um empresário que me pedia um LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho). Segundo esse empregador, não lhe restava a menor dúvida de que sua empresa era salubre, e portanto, nenhum de seus empregados fazia jus ao adicional de insalubridade. O que ele alegava era que, apesar dos riscos biológicos existentes, não havia contato habitual / permanente dos empregados para com os riscos.

Esse é um típico caso em que o empregador não quer “um LTCAT”, mas sim, “o LTCAT”.

Explico: o que o empresário queria era comprar a conclusão do LTCAT dizendo não haver insalubridade em sua empresa conforme sua própria opinião, e não pagar pela minha análise fundamentada daquele ambiente de trabalho. Eu bem que deveria ter feito a cobrança antecipada para elaboração desse documento, mas infelizmente não o fiz. Mas é assim mesmo: vivendo e aprendendo…

Pois bem, ao avaliar a empresa em questão, percebi que a fala do empregador era mesmo correta. Tratava-se de um ambiente que apresentava risco biológico conforme o Anexo 14 da Norma Regulamentadora n. 15 (NR-15), mas que os empregados estavam expostos de forma intermitente (e não habitual e nem permanente).

O texto do Anexo 14 da NR-15, é enfático: para que se configure insalubridade por risco biológico, há necessidade de “trabalhos e/ou operações em contato permanente” com as situações qualitativamente elencadas. Sob o olhar apenas da NR-15, estaria mesmo desqualificada a insalubridade naquele ambiente.

No entanto, vejamos o que diz a Súmula 47 do Tribunal Superior do Trabalho (TST):

“O trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional”.

E agora, a quem seguir: NR-15 ou Súmula 47 do TST? Darei aqui minha sugestão de conduta.

Imaginem que, sobre o mesmo caso narrado, o Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança do Trabalho (titulares legais para confecção do LTCAT, conforme Art. 58 da Lei 8.213 / 91), use apenas o Anexo 14 da NR-15 para subsidiar seu laudo. Dessa forma, devido ao trabalho intermitente observado, não haveria insalubridade naquele ambiente.

Imagine que, após alguns anos, houve um processo trabalhista nessa mesma empresa. O juiz então, com base na Súmula 47 do TST, entendeu que aqueles funcionários mereciam ter ganho o adicional de insalubridade durante todo período em que lá trabalharam. É assim é a sentença.

Como defesa natural, o advogado da empresa poderá chamar o autor do LTCAT ao processo (o que no Direito recebe o nome de “denunciação da lide”, preconizada no Art. 70 do Código de Processo Civil), ou dizer posteriormente numa “ação regressiva” (Art. 930 do Código de Processo Civil) contra o autor do LTCAT, que só não houve o pagamento do adicional de insalubridade porque o LTCAT desobrigava a empresa dessa necessidade. Sendo assim, o advogado da empresa coloca que, por ter agido com imperícia, o autor do LTCAT é quem deveria custear os prejuízos que a empresa teve em virtude dessa descapitalização inesperada.

Bem sei que essa situação narrada é hipotética, de resultado final imprevisível, mas juridicamente possível.

Pelo exposto, diante do caso concreto apresentado, apesar do trabalho intermitente daqueles empregados, optei por qualificar a insalubridade com base na Súmula 47 do TST. Se o próprio Juiz do Trabalho usa o princípio do “in dúbio pro misero”, na dúvida entre usar a literalidade da NR-15 e a aplicabilidade processual da Súmula 47 do TST, acho mais seguro usar o dispositivo que mais alarga o benefício para o empregado.

Discutível? Muito. Fiquem a vontade para usar apenas a NR-15. Não critico ninguém que o faça. Mas para minha própria segurança jurídica, particularmente prefiro usar a possível óptica de um Juiz do Trabalho, e considerar a Súmula 47 do TST em meus LTCATs.

Resultado do caso: o empregador não gostou da minha conclusão, desmereceu meu trabalho e não pagou pelo serviço que eu havia feito. Preferiu procurar um outro Médico do Trabalho para fazer “o LTCAT” que ele buscava.

Lição aprendida: todo LTCAT deve ser sempre cobrado antes! Não permitamos que o pagamento pelo LTCAT esteja vinculado à conclusão que ele trará.

E com relação a mais importante conclusão que um LTCAT deve apresentar: no caso avaliado, houve enquadramento dos riscos analisados entre aqueles capazes de gerar a aposentadoria especial, nos termos do Anexo IV do Decreto 3.048 / 99?

Não! O item 3.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048 / 99 diz que, em se tratando de estabelecimentos de saúde, terão direito à aposentadoria especial, somente aqueles que desenvolvem “trabalhos em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados”.

Explicando o texto acima, na mesma esteira, vem o Art. 244, parágrafo único, da Instrução Normativa n. 45 / 2010 do INSS, que assim coloca em sua explicação sobre a confecção correta do LTCAT:

“Tratando-se de estabelecimentos de saúde, a aposentadoria especial ficará restrita aos segurados que trabalhem de modo permanente com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas, segregados em áreas ou ambulatórios específicos, e aos que manuseiam exclusivamente materiais contaminados provenientes dessas áreas.”

Como o caso avaliado não se encaixava exatamente nas condições acima descritas, segundo as regras do INSS, não caberia enquadramento à possibilidade de aposentadoria especial para tais empregados.

Apenas pra ficar claro: a Súmula 47 do TST diz que o trabalho intermitente não descaracteriza a insalubridade (mas não alarga esse entendimento para concessão de aposentadoria especial). Conforme visto, é importante observar, mais uma vez, que: a análise de insalubridade / periculosidade é diferente da análise da aposentadoria especial.

Que Deus nos abençoe.

Marcos Henrique Mendanha

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